quinta-feira, 6 de julho de 2017

Um texto de adeus



Vamos correr pelo campo das margaridas? Nada de flores exuberantes, aprecio passear com você entre pedacinhos de sol e nuvem, entre zunzuns de abelhas e o vento leve desses vales. 

Somos companheiros, e me diverte sua curiosa intromissão em assuntos que não lhe dizem respeito, creio que o que me surpreende é sua total falta de jeito. Portanto, vamos correr entre margaridas, que, em algum momento, sei que emergirá com uma tola guirlanda sobre a cabeça. Como os pastores flautistas. como índios que se enfeitam para festas. Ou pelo menos, com o nariz amarelado de polén, e o seu rastro será ele de olor intenso.

Mas como você corre! Muito mais rápida que eu. Já lhe vejo perto do horizonte, uma haste cambiante, ao longe. Venha, há uma clareira, vamos descansar sobre a terra nua, a terra que é avesso dos sonhos, e por isso nos permite, às vezes, bordar um manto de raízes. Deixo você aqui, no descampado, preciso voltar, desculpe, ainda não posso me ajeitar lasso. Mas sempre que quiser, corra, pule, salte, misture-se com a relva. Sua alegria alegra o mundo. Qualquer mundo. 

Ninguém me esperará ao portão, mas eu sei que você me aguarda dentro de outro esperar, inescapável. As nuvens de terras serão seu cetim, o sol e a chuva trarão notícias minhas. Nesta clareira, onde estivemos, há algo perene que nos une: pois cada amor sabe de si, e você sempre se alegrou com as correrias, lá, onde brotam margaridas. E a gente correu tanto, se lembra? Já temos nosso memorial de incríveis tolices! Sinceramente, o meu melhor tesouro. 

José Antonio Abreu de Oliveira


Imagem: Google


Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

...